quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Mário Cesariny

Uma Certa Quantidade

Uma certa quantidade de gente à procura
de gente à procura duma certa quantidade

Soma:
uma paisagem extremamente à procura
o problema da luz (adrede ligado ao problema da vergonha)
e o problema do quarto-atelier-avião

Entretanto
e justamente quando
já não eram precisos
apareceram os poetas à procura
e a querer multiplicar tudo por dez
má raça que eles têm
ou muito inteligentes ou muito estúpidos
pois uma e outra coisa eles são
Jesus Aristóteles Platão
abrem o mapa:
dói aqui
dói acolá

E resulta que também estes andavam à procura
duma certa quantidade de gente
que saía à procura mas por outras bandas
bandas que por seu turno também procuravam imenso
um jeito certo de andar à procura deles
visto todos buscarem quem andasse
incautamente por ali a procurar

Que susto se de repente alguém a sério encontrasse
que certo se esse alguém fosse um adolescente
como se é uma nuvem um atelier um astro

Mário Cesariny

3 comentários:

  1. Um criador completo Cesariny…vanguardista, que ousou ser sem medo das regras sociais…

    A arte é a mais bela forma das almas se tratarem por tu, de serem intimas…

    as almas são a liberdade absoluta do ser e do existir,que está para além do embaraço comercial das palavras, para além da escravidão das exigências sociais. A alma tem vida própria e distante de todas as rudezas das convenções sociais. Todo o nosso ser se comunica pela alma, quando queremos por o corpo acima da alma na comunicação tudo falha…porque tudo è superfície, e a alma humana é profundidade…é Ser !
    Como é belo quando as almas sorriem umas para as outras nesse conhecimento e entendimento maior .

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  2. Maravilhoso o papo deste poeta português.

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  3. Cesariny

    Pintor e poeta português, natural de Lisboa.
    Viveu em Paris, cidade onde conheceu e privou com André Breton, em 1947. Rapidamente atraído pelas propostas do movimento surrealista francês, tornou-se um dos mais importantes defensores do movimento em Portugal. Ainda nesse ano, integrou o Grupo Surrealista de Lisboa.
    Cesariny, figura sempre inquieta e questionadora, afastava-se assim, de maneira definitiva, do movimento neo-realista. Passou a adoptar uma atitude estética de constante experimentação, logo visível nas suas primeiras colagens e pinturas informalistas realizadas com tintas de água, e distribuídas no suporte de forma aleatória. Seria este princípio anárquico que conduziria a obra de Cesariny ao longo da sua vida (incluindo a sua produção poética, que o autor considerava construir a partir deste desregramento inicial das suas experiências na pintura). A continuidade da sua prática plástica levá-lo-ia, portanto, a seguir uma corrente gestualista, por vezes pontuada de um corrosivo humor. Dinamizador da prática surrealista em Lisboa, Cesariny iria criar «antigrupos», com a mesma orientação mas questionando e procurando um grau extremo de espontaneidade, tentativa também visível na sua obra poética.

    vale a pena uma pesquisa à obra dele...

    * Odorei a imagem que escolheste para o poema.

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