domingo, 21 de outubro de 2012

jazz poesia - maria andersen


do cálice sei apenas o vinho
apenas a morte
no coração do tempo arando fugas
vou
descortinando eternos
recolhendo piedade
no horto silvestre
à velocidade acólita  da língua
tenho amuletos nas rosas
azeitonas cremadas na margem repentina
onde os meus poemas
não são para serem entendidos
no estame da luz breve
tenho papoilas na navalha
cannabis no vapor matinal
e a minha carne dentro do mar
como narciso
sucumbi na rota do sentido
no ocre do solstício
onde eu sou vertical
com sal na pele e a boca cheia de tempo
e da efémera promessa
falcão no pretexto das conversas
as que principiam com a fuga para lugares
que a razão omite
hora da garantia
onde vacila o último verão
espelho – nácar no corpo
que eu própria ilumino
leva
leva de mim sedimentos e coragem
espasmos e dinheiro
que a poesia sou eu
antes de me procurar nos baixios por onde ando
vales humanos
onde o cotovelo é forma
onde o braço é boca
onde a cabeça é comboio a colidir
faço tratados de paz
simulo conhecimento
decifro coisas que não vês
estou no sítio do desconforto
onde a ironia é pena
onde o salpico é palavra
onde o ser é estigma
onde a insignificância é violeta na lápide
é narciso murcho na jarra da ciência
e o tempo jazz citadino
e nós  cartas de tarot
esquecida na mesa
 - Jazz poesia! -

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

bardos poetas - poema 3

aquilo que te trouxe
aquela que me leva
amoras maduras
índios como corações tangendo gritos
Aquiles ferido no nervo
foi a tenda – tendenciosa
as folhas secas no deslumbre dos barcos
o verde lúdico da estação
a folha em que escrevo – é noite
todavia são elas perigosas
canais de sangue
santificado seja o suor
a febre da dança aqui
Don Quixote nos moinhos
é outra a fórmula
à nascente tenho sede
totens totais
tens a fuga como o fio de Ariadne
a vertigem está à cabeça da literatura
aqui jazem serpentes
parabéns para você
nesta data ferida
tenho pirilampos nos olhos
balagandãs nos dias em que demoras
aquele que brinca de viver
viverá mesmo depois
estou à cabeceira do tempo
nenhuma alma na quebrada
nem anjos na guarda
tenho mais boca no cais dos poemas
dói até os cabelos
raspa os pelos
conjura os poentes
até chorar a nudez
onde sobem os olhos
meu Batman perdeu a capa
perdeu o cinto
fez-se sol enquanto as mulheres deram prantos
atenção
 o nervo tende
as ruas são cinemas mudos
a vida encruzilhada

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

bardos poetas - poema 2

viro-me para dentro
tenho lá tanta origem
subo até anoitecer
a variável velocidade do dia/ noite
noite/ dia veloz varia
é circo meu amor
tudo é circo – os homens não sabem
outro argumento senão fingir 
o que não são
dentro deste tempo a vida urge
e surge o que se é
desceu tarde a noite ao útero
a seara amadureceu
a cigarra canta
toca tua campainha
atende somente o verdadeiro
tenho os pés nus sobre o tempo
cajus à porta da fonte
jacarandás à varanda
tem música o olhar
hardcore nas sombras
tudo nos é caro e raro
e tudo nos é escasso
mamutes tiveram piedade
e desapareceram

terça-feira, 9 de outubro de 2012

bardos poetas - poema um

a fera fede e fere a si
aos seus e aos fidedignos
e se a noite se despir sobre o mar?
quando menos se espera
o choro é fado
rostos                                  tantos rostos
tantos anos
tantos séculos
tantas fontes
caminho por onde olho
as armas não tem planos
guardadas
 são apenas...
tenho pena dos insanos
e das flores         e das ervas
que se abandonam
no âmbar dos teus olhos
passo  por aqui na orla das meninas
guarda somente as sementes
joga fora as daninhas
desço letras tão devagar
como se fossem montanhas
rios nascem nos olhos
se a mente dana
mina o que brota
aqui a noite se faz alma
uma esplanada aberta