a rua é este passado antigo –
ombros carregados com gravatas dos lados
ao ritmo cerebral que nos rasga em tropel o corpo
- estupor ofício –
é preciso que a noticia corra de boca em boca enorme e intransponível
como um ofício devastador e profundo
- se o amor fosse esta lírica expiando frutos
este tempo imigrado e imprevisto -
mas o amor é esta vastidão de séculos e de diálogos sibilinos –
lâmpadas a fundirem-se a transbordarem o coração
com um tormento envaidecido
e a vida imensa que perseguimos
- será a brevidade o tempo da inocência
bordando-nos rosas na boca?
há-de-nos cantar imensa a eternidade
com violinos queimando-nos a pele
- passarão as horas e as rosas quando aqui estivermos
sentados à varanda – mas não passaremos nós
digo-te agora – que o poema
é este rosário com martelos a partir
os ponteiros dos relógios
- somos tão contemporâneos
com uma comoção intacta no arco da garganta
ah dizer-te que desabito as horas
que este sumário de dias virados para dentro
é este trajecto em direcção a ti
- determinaram-nos o sexo – o retrato – os anos
prever-te o nome não me estava reservado mais do que amar-te
se soubesses que do que sei há tanto que ignoro
bebo-te neste vinho das palavras e estremeço
pudesse a saudade sacudir os gestos e os espasmos
pudesse eu ter outra pátria
mas a minha terra és tu como uma língua de fogo profunda
a apelar-me ao coração
- a ânsia é uma eterna viagem
o espelho vida e razão de que a memória é diário
que sangue – que corpo interminável – que porta –
que fogo estranho me pode salvar mas do que tu ?
as palavras são como horas degoladas
onde sofremos esta mesma nostalgia
talvez a vida seja outra vida estranha e simples
e a nossa espera o lume a que eu sempre regresso
ah instante – cidade sem pássaros
como um precipício à beira da boca
desonesto infinito – abrindo-nos os olhos
“ as mil e tantas horas” de hoje
o coração é filho da vida
e a nudez é toda dentro de nós
eis-me – poeira privada neste pedaço de terra
onde choro com ideias nos olhos condenados à morte
meu amor – este uno plural - nós
onde o leito é esta solenidade
vazando-nos os olhos com pássaros sem bico
corda com que me ataste de vida o peito
parindo-nos astros no centro
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