quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

500 poemas e ainda toda uma vida pela frente

Este blog completa quinhentas postagens, são mais ou menos 500 poemas que divido com os leitores, os seguidores e os amantes da poesia contemporânea nestes últimos dois anos e meio. Isto não seria possível sem a colaboração dos poetas vivos que fui encontrando à partir do momento em que lancei o blog no final de 2010. Alguns, conheço pessoalmente, outros somente via web, mas é como se conhecesse, afinal de contas, todos aqui falam a mesma língua. Todos aqui tem um compromisso com a linguagem poética. Este blog é um livro aberto e em pleno desenvolvimento...sempre publicando textos poéticos, meus e de outros poetas, deixando ao leitor a tarefa crítica da apreciação ou não dos textos publicados. Abaixo, as  fotos dos poetas que frequentam este blog com suas poesias:
Maria Andersen, poeta portuguesa da região do Minho, também assinou textos como Fátima Meireles.
Valmir Jordão, poeta pernambucano, autor dos livros Haicaindo na Real e Poemas Diversos.
Zé Mateus, poeta paulistano autor do livro Despautério.
Kleber Gutierrez, autor do livro Letra.
Claudia Freire, autora dos melhores haikais publicados aqui, inédita em livro.
Cleide Guedes, poeta bissexta e grande amiga.
Joaquim Monteiro, poeta português.
Juarez Machado, músico e poeta de São Bernardo.
Leonard Almeida, poeta e artista paulistano do ABC.
Jefferson Beat, poeta de Santo André.
Isidro Iturat, poeta espanhol criador dos famosos Indrizos.
Cris Biagi, poeta surpresa do blog, textos deliciosos.
Carlos Emílio Faraco, talvez, o melhor poeta do Facebook.
Palhazar Nasso, poeta francês, grata surpresa.

‎"A maior parte das pessoas vai à falência por ter investido com demasiado peso na prosa da vida. Acabar arruinado pela poesia é uma honra."

Oscar Wilde

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

humanismo decantado - maria andersen

a violência do dia caí-me em cruz dentro e fora

a vida desce até um certo lugar

tão poucas vezes visitado

como um tempo deserto

seco e surrealista

e uma certa obstinação no rosto

podia dizer que estou neste humanismo decantado

que me impregnou até ao lugar mais subterrâneo

hoje guardei debaixo do esquecimento

todos os relógios –

isto também é uma vertigem

uma sobrecarga de verbos e literatura

no palco de um cabaré

a vida e o tempo são um duelo

de gestos e sombras e luzes que se alongam

e a memória tantas vezes uma morte súbita

trazemos na alma um vaticínio de séculos

um destino com fisgas nas mãos

dependurando na braguilha ponteiros partidos

como se fosse só um passeio louco e matinal

podia mostrar-te as escravas que tragos nos dedos

a renascerem-me por épocas

aritmética de espantar quase sensata

com doses excessivas der banal

nasceram-me na língua fogueiras castradas

ferroadas de textos incapazes de nomear poetas

o perigo é a hipocrisia

a virtude estilística da própria carne

na mesma predestinação

isto que escrevo podia ser uma heresia ridícula

como horas vendidas a metro na feira da ladra

toda a voz tem ramos com céus e infernos

e todos os sentidos são essas cidades densas

a dar um certo 100 brilho à lírica

os que me ouvem comecem a sofrer toda a minha dor

e a rir - a rir - a rir com metáforas na ponta da língua

e um verso de amor “ queimado por mais fogos do que aqueles que eu ateei “

nem todos os livros são primeiros - nem segundos - nem terceiros

e nem toda a emoção é compilação rasurando obstáculos

nem todo o visível é concreto

nem toda a dança é etapa breve deste meu génio

ímpeto das minhas mãos com toda a metafisica lá dentro

veias privadas e escandalosas como um rio latente

sobre um lugar exaltado onde me nasceu o universo

digo agora mundo e babel

despois desembriagada

sou uma passagem por onde passa a solidão

tudo nos é labirinto numa quase violação

e todos nos dão impostura nas palavras

reduzidas a chão a beber na sola dos sapatos

nasceu-nos a morte no mesmo útero

uma multidão de riso com asas verdes

e esta vã nudez tão frágil –

para lá da ampulheta

os pés - o giz - a ponta dos dedos -

e os dentes a que estendo os olhos

burel de estopa como agasalho gasto

o que escrevo é este crivo e este redor sem direcção

este fantasma do instante como um lagarto

e a subir-me a pele teus olhos quase índios

vigília no meu sono

luzes desta hora em tropel pela garganta acima

onde a maré alta é esta arte de formigas

como um quartel de viúvas quase virgens

vida – este vício andante a que me dedico

a morder-me até à folha do caderno

em que escrevo tarde e sorte em cada letra

sino de gestos tocando poentes com jarros e bem me queres

xisto – uma criança na boca a pedir póneis e atenção

com gravidade nos olhos

vou por aí adiante na berma do caminho

a dar poemas aos pássaros

quanto tempo terá passado por aqui

a cismar nos vastos pensamentos uma certa metafisica

espantei sóis nas telas de linho ao terminar o dia

atirei filosofia à noite como os olhos dos amantes

nem tudo é caminho com bicicletas azuis às esquinas

onde não há barulho nem becos

e o espelho vai para lá do grito e das cabeças



segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

naftalina - claudia freire

Baratas me esperam chegar, fugidias
Cruéis , degeneradas, asquerosas, fingidas
Vadias, exclamam em uníssono: “Não és mais bem-vinda!”
Avisam que na casa não há mais ar, nem cor, nem vida
Admito que sou ré, vilã e bandida
Que não vejo entre dois nem ida e nem vinda
Que vejo, um a um, uma triste partida
No sol e no mar, solidão me tem combalida
À noite recosto em um travesseiro de pedra
Relaxo num banho de água saloba
Fervo um chá de lama e joio
O dia apavora, a madrugada enquadra
A bela praia da infância, hoje areia movediça
O velho sonho de menina, hoje memória desativada
A ilustração do conto de fadas, hoje rascunho mal-fadado
Babo, a língua enrola, língua esta outrora castiça
Odeio o amor, sua palidez ardilosa
Sou unha sem carne, um naco de torpor
Quando finda poesia e prosa
Realizo no fim que tudo é dor, dor e dor

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

quarta-feira de cinzas - carlos emílio faraco

Dançaram, porque dançar é preciso.
Cantaram, porque cantar é preciso.
Sonharam, porque sonhar é preciso.

Mentira, Senhor.
Fizeram tudo isso,
Porque nada disso é preciso:
É tudo impreciso.

E, por impreciso,
Surpreendente
E necessário
Para um hoje
Cuja aurora se ruboriza
Cada vez mais,
Diante da falência
Do arco-íris cotidiano.

Por isso,
Foram para casa
Fantasiados
E felizes,
Exorcizando dores.

as mil e tantas horas de hoje - maria andersen

a rua é este passado antigo –

ombros carregados com gravatas dos lados

ao ritmo cerebral que nos rasga em tropel o corpo

- estupor ofício –

é preciso que a noticia corra de boca em boca enorme e intransponível

como um ofício devastador e profundo

- se o amor fosse esta lírica expiando frutos

este tempo imigrado e imprevisto -

mas o amor é esta vastidão de séculos e de diálogos sibilinos –

lâmpadas a fundirem-se a transbordarem o coração

com um tormento envaidecido

e a vida imensa que perseguimos

- será a brevidade o tempo da inocência

bordando-nos rosas na boca?

há-de-nos cantar imensa a eternidade

com violinos queimando-nos a pele

- passarão as horas e as rosas quando aqui estivermos

sentados à varanda – mas não passaremos nós

digo-te agora – que o poema

é este rosário com martelos a partir

os ponteiros dos relógios

- somos tão contemporâneos

com uma comoção intacta no arco da garganta

ah dizer-te que desabito as horas

que este sumário de dias virados para dentro

é este trajecto em direcção a ti

- determinaram-nos o sexo – o retrato – os anos

prever-te o nome não me estava reservado mais do que amar-te

se soubesses que do que sei há tanto que ignoro

bebo-te neste vinho das palavras e estremeço

pudesse a saudade sacudir os gestos e os espasmos

pudesse eu ter outra pátria

mas a minha terra és tu como uma língua de fogo profunda

a apelar-me ao coração

- a ânsia é uma eterna viagem

o espelho vida e razão de que a memória é diário

que sangue – que corpo interminável – que porta –

que fogo estranho me pode salvar mas do que tu ?

as palavras são como horas degoladas

onde sofremos esta mesma nostalgia

talvez a vida seja outra vida estranha e simples

e a nossa espera o lume a que eu sempre regresso

ah instante – cidade sem pássaros

como um precipício à beira da boca

desonesto infinito – abrindo-nos os olhos

“ as mil e tantas horas” de hoje

o coração é filho da vida

e a nudez é toda dentro de nós

eis-me – poeira privada neste pedaço de terra

onde choro com ideias nos olhos condenados à morte

meu amor – este uno plural - nós

onde o leito é esta solenidade

vazando-nos os olhos com pássaros sem bico

corda com que me ataste de vida o peito

parindo-nos astros no centro


terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

vieja chota mediática - isidro iturat


 Ya fuiste miss y ahora eres misterio
 de psicólogos: ¿Cómo ante el espejo
 crees que fascinas, siliconiengendro?

 Ayer epifanía, abierto cielo
 fuiste, hoy eres mapa del infierno.
 Y el cirujano : “Sí, más culo y pecho...”.

Crees que se puede botoxear el tiempo

 y antes de muerta ya eres sombra, espectro. 

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

outros

uns tentam ganhar no grito
uns ganham tentando um rito
uns emburreceram para sempre
uns para sempre burros...eram
os outros

poemas diversos - valmir jordão

esse é para não esquecer:
quem combate os radicais livres
é a vitamina c.
...
em época de
evasão escolar,
a que classe falar?
...
são trinta homens sentados
chopp solto, desejos presos
e trinta mil sonhos chapados
...
pode crer, bicho
tem muitos pregos
nas mãos de Cristo

...estes são alguns dos poemas curtos que selecionei do livro Poemas Diversos do poeta recifense Valmir Jordão em turnê atualmente pelos saraus de São Paulo...li e recomendo o livro deste grande poeta pop pernambucano!


quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

hora barroca - maria andersen

esta hora inspira grandes poetas - a rua cobre-se de um silêncio quase líquen – um jazz
esborda-me os ouvidos e o café sabe-me a viagem - 14h cheguei para o turno da tarde –
encontrei-o na habitual solidão depois de o distrair do lugar de si próprio – contemplamos
juntos o instante – trocamos palavras chave onde tudo é um jogo social . todo o lugar é
outonal – as rotinas sempre sedentárias, sem nenhuma outra existência . enquanto eu penso e
escrevo frases inacabadas – alma sentida como um andrajo que flutua ao vento e de caminho
confraterniza com outras almas . o tempo pesa em qualquer lugar do último verão – tudo nos
acontece uma só vez . a única peregrinação é deambular de sonho em sonho – como de lugar
em lugar nas leves reservas do olhar – albergue onde nos guardamos. a rua é antiga e aberta
ao êxtase da natureza. o céu abre-se de azul, o monte é um jardim desaparecido – iminente –
penso quando me falas do teu pai, das lágrimas que por vezes te sulcam o rosto – a chuva é
numerosa em certos dias e o mar carrega-nos o peito. às vezes os pés entorpecidos – o
tempo todo a correr-nos nas mãos – e temos mais caminho que pés – tudo me é no
pensamento um filme – joelhos dobrados sobre a flor de burel - a infância é sempre um
presença, um domicilio em que nos entranhamos – a arte esbraceja-me nas mãos- nos olhos –
na boca – no pensamento, e sucedem-se aqui grandes desertos – carruagens de esboços,
pensamentos sem rentabilidade – palavras herméticas – gíria deste tempo tão dividido. há
lugares da terra tão bonitos que gostaríamos de os apertar ao coração . aqui a vida dura como
presa à raiz da terra. eu própria sou terra com o mesmo vício – um refugio de eremitas onde
me brota a criação – eterno lugar humano . a ponte é romana – a arquitectura o selo – o rio
um baú de histórias e de séculos e uma certa elegância primitiva – é novembro e o dia tem a
mesma rotina implacável – bebo em lentos goles licor beirão e escrevo de pensamento
inundado de olhos e de rua – esta rua onde me exilo quebrando a abstracção – aqui onde o
virtuosismos das vozes me assalta – onde a saudade de ti é mais extensa e tudo é mais sonoro
– estou aqui sentada a querer escrever o que não sei – lento exercício de mim mesma – tudo
me exila como uma claustrofobia – o bar nostálgico – o telefone que toca – a via larga das
palavras onde nos entendemos – a arte do que somos e fazemos – os recantos íntimos onde a
vida subsiste – o zinco verde da porta batida – uma rendilhada arquitectura com desenhos
inimitáveis – escuto miles davis – a boca esculpindo-se nos blues e bob dilan cedilhando-nos a
vida de uma rima cannabis obsessiva a riscar o incerto – a volúpia sovando o céu do Índico sal
– assim eu danço nos olhos do flamingo nua regurgitando-me de línguas bifurcadas -
sobrevivemos de um extenso dicionário – de um carrinho de rolamentos que outrora era
léxico quotidiano de um génio que nos junta à festa – assim digo-te – sofre, bebe, droga-te,
anda de cócoras e mostra o falo às palavras deste tempo fracturado – deste olhar exposto à
miséria – nascemos primogénitos e assim permanecemos onde o eco nos repetir – além das
servidões humanas gritamos á porta da morte – foda-se! – como inocentes animais banhados
de Nilo – vamos a lavrar de enxada nas mãos o poema que nos consome de guerra a garganta
– os poemas são masculinos e femininos e enchem as praças – estala a noite e o tempo – e
começam nas línguas das aves os fuzilamentos – encerra-me a boca e os ouvidos - dá-me do
poema o derradeiro aceno – a caligrafia gaga – os punhos cerrados e o tempo todo nos forros
das algibeiras - jorra-me assim no sangue a minha humanidade – a palavra expatriou-se e o
que digo é a esquina do mundo – um país por fazer – uma viola que tocas até ao último
mistério onde se solta a profecia – remoto culto – prazo de coisa fugaz onde se pariu o
crepúsculo prenhe de sombra e de charro – sexo no poemacto - repara como os dias crescem
manhãs como os pássaros à toa num sol de cidades imprescindíveis perfilando os ventos com

palavras sem dentro – capim onde adormeço acenando à memória com um suor moreno
tingindo o pó desses mortos já tão maduros em nossas bocas primogénitas - olhos de grandes
fogueiras onde o céu nos tomba por dentro fulminante – leve – droga heroína onde nos bate
o corpo – deuses que são mitos quebrados contra os dentes – orgasmos convulsivos de todas
as coisas – outros dedos estilhaçados como um bafo de hienas na savana – berro a história
sem qualquer mágoa – com vómito de certos olhos faquires apontando as sombras – alemo-
nos à busca de qualquer astro - do vinho nasceu o canto – da fome nascemos nós colonizando
de inquietação a saudade – escuto coisas em que me deslumbro – pólen pousado no sol -
cineolho alargando do mundo o úbere - amplidão vivendo –me a pele neste barro mátrio -
nudez que a prumo habito – numa rectidão - barco ancorado à varanda na memória das
viagens calcinadas – rumor derrubando estátuas com mãos de terra e asfalto como semente
onde o fruto já clama – hei-de fazer-me monge – crescer à sombra de um choupo branco – ser
sangue no desejo da bravura, nas horas dos mil poemas de onde desato os prodígios – cripta
da palavra onde a escassez é hossana – louvada seja a graça e a garça - a fundura – o mar – o
ex-voto e o busto brando – a frine de draxiteles que comoveu o juís – o pudico botão de rosa
que não se abre – o mês que se perde no poente – arignota de safo – ausência onde a luz se
expande – ovo de ser original como uma estrofe fêmea – saber que ao poeta chancela os
lábios – sacro poema que com o dentro pinto a alva liturgia de um grito que em origem me
rebenta na boca

*****

sábado, 2 de fevereiro de 2013

salto mortal - zé mateus

para cada cintilância
há uma sombra
tudo que tocamos
nos toca também

& nos equilibramos
na equivalência,
a pé
 o salto mortal

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013